António Variações, o ícone português dos anos 80

António Variações

Apesar da sua curta carreira, que terminou abruptamente devido à SIDA, o cantor português António Variações (nascido a 3 de Dezembro de 1944 e falecido a 13 de Junho de 1984, Dia de Santo António) é um dos maiores ícones pop da música portuguesa dos anos 80, sem paliativos. Só conseguiu lançar dois discos (Anjo Da Guarda em 1983 e Dar & Receber em 1984), mas tal foi a revolução do seu som em Portugal que ainda hoje a sua música é considerada de interesse nacional. Se você não conhece este autor único, aqui vamos te contar porque, além de ser um dos primeiros artistas a trazer Synth-Pop e New Wave no seu país de terras distantes, ele ainda é hoje um dos mais relevantes de sua história.

Quando escrevemos sobre velhas canções portuguesas, uma vez mencionamos o António Variações, por ser um dos grandes expoentes da música do país vizinho (neste blog escrevemos desde Espanha). Foi assim, principalmente, porque focamos sobretudo no fado e nos géneros mais clássicos e conhecidos do país. No entanto, este vazio deve ser preenchido sem a menor hesitação. Porque, apesar de terem lançado apenas dois álbuns, o nível de todo o seu repertório é tal, assim como a quantidade de material inédito existente, que merece um artigo à parte.

Nele, iremos recomendar as suas melhores músicas, falaremos sobre o álbum tributo feito pela superbanda portuguesa Humanos, formada por Camané, David Fonseca, Hélder Gonçalves, João Cardoso, Manuela Azevedo, Nuno Rafael e Sérgio Nascimento com a intenção de recuperar boa parte do repertório compilado em demos ou gravado por Variações em seu gravador pessoal, com o qual ele guardava melodias e letras que havia inventado anos antes de encontrar a banda com a qual começar a tocar suas músicas de verdade.

Discografia, peças da sua vida e melhores canções de António Variações

No final dos anos 70, o cabeleireiro António Joaquim Rodrigues Ribeiro viveu na Holanda e assimilou os novos estilos musicais que iam surgindo no panorama internacional, sem nunca esquecer o quanto adorava a música popular e a cultura portuguesa. Foi com esses vimes (muito brevemente) que o tipo de música que ele faria anos depois começou a surgir em sua cabeça. Ele pode não ter sabido então, embora seja bastante óbvio que ele sonhava em fazê-lo, como as fitas que ele gravou atestam isso.

Tanto que, entre as músicas que compuseram seu primeiro disco, destacou-se uma versão de Povo Que Lavas No Rio, música de Amália Rodrigues que o fascinava desde criança. Assim, para além de lhe prestar homenagem no seu primeiro disco, onde misturou elementos da música moderna do momento (punk e new wave) com a clássica canção portuguesa com grande mestria, conseguiu ser a banda de abertura do concerto de regresso da fadista mais famosa do momento.

O fato é que em 1978 já havia assinado contrato com a Valentim de Carvalho, mas seu primeiro EP só sairia em 1982. Isso se deveu principalmente ao fato de a gravadora ainda não estar pronta para lançar o tipo de gênero com o qual ele pretendia dar-se a conhecer. Pelo contrário, a gravadora queria produzir música folk ou pop e transformá-lo num renovador do fado.

No entanto, ele logo se tornou um emblema (assim que foi autorizado a ser ele mesmo). Não só pela sua música (em 1982 lançou o seu primeiro EP, Estou Além), mas também pela sua personalidade, pela simplicidade em manter o emprego de cabeleireiro e, sobretudo, pela sua forma de cantar. Ele adorava gravar suas músicas no banheiro, onde considerava que sua voz soava melhor, o que explica o eco e a acústica de seus discos, clássicos em muitas produções dos anos 80, na verdade. A seguir, indicaremos as que são, para nós, as melhores músicas de sua discografia.

Anjo Da Guarda (1983)

O primeiro disco de António Variações, Anjo Da Guarda, é, como dizem, redondo. A sério. Se gosta de música internacional dos anos 80, este álbum fará parte da sua vida desde o dia em que o ouvir pela primeira vez. Não é uma piada ou um blefe. Músicas como Estou Além, … O Corpo É Que Paga, É P’ra Amanhã, Sempre Ausente ou Anjinho Da Guarda atestam isso. Suas letras, muito pessoais e à frente de seu tempo (pelo menos pelo que assumimos daquela época), focavam acima de tudo na solidão, na necessidade de sermos amados e na nossa capacidade de nunca nos sentirmos confortáveis ​​em lugar nenhum. Fora do lugar e do espaço, o que isso diria. Ansiedade e insatisfação, como ele mesmo definiu no primeiro tópico citado.

Este primeiro álbum continha um total de 11 músicas, das quais já destacamos 5 e teríamos que adicionar uma sexta na versão que mencionamos anteriormente. Como você pode ver ao ouvi-lo, o uso de sintetizadores em sua música é constante, deixando claro que ele foi parcialmente influenciado pela cena internacional, mas principalmente pelo uso do órgão dentro da música folclórica nacional, que é onde fica a chave.

Dar & Receber (1984)

Este segundo álbum, Dar & Receber, contém temas que imediatamente adquiriram um significado muito além de suas próprias letras. O seu primeiro single, Canção De Engate, foi um sucesso em todo o país, e tocava em todas as rádios enquanto o cantor estava internado no hospital por broncopneumonia relacionada com a sua doença logo após o lançamento deste álbum.

Se você pensar sobre isso, a verdade é que você sente uma dor tremenda. Pelo menos temos a música que ele nos legou, embora ainda seja uma pena saber o que aconteceu. O mesmo que se pensa de Freddie Mercury ou em Espanha com Tino Casal (embora não tenha morrido de sida, mas sim de um acidente de viação, as carreiras de António Variações e Casal parecem ter vários pontos em comum).

Além do primeiro single, recomendamos Perdi A Memória, Erva Daninha Alastrar e Dar E Receber. Não sabemos se foi pela pressa em querer lançá-lo, ou por outros motivos relacionados com o estado de espírito do cantor português, no geral não parece ser um trabalho tão redondo, apesar de conter grandes canções que fazem parte inseparável da história da música de Portugal.

Humanos, a homenagem que António Variações merecia

Em 2004, grandes vozes da música moderna portuguesa como Camané decidiram homenagear o artista António Variações compilando e reinterpretando algumas canções que nunca publicou sob o título da banda. Neste álbum destacamos a música Maria Albertina, cujo videoclipe se passa em um salão de cabeleireiro como uma segunda homenagem além do próprio álbum.

Apesar de não ser uma obra tão completa como a do autor original, talvez pela falta de sintetizadores e ecos nas vozes, o seu sucesso levou este supergrupo a lançar um álbum ao vivo dois anos depois. Aparentemente, o irmão do cantor dos anos 80 ainda guarda todas as suas gravações, então a escolha do repertório foi um trabalho bem medido que poderia dar material suficiente para gravar outros álbuns, embora não pareça que isso aconteça depois de tantos anos.

Variações, o filme sobre António Variações

Variações (Guardian Angel)

Se tem vontade de saber mais sobre o António Variações, pode estar interessado em ver o filme Variações (chamado Anjo da Guarda em Espanha), onde o ator Sérgio Praia interpreta o cantor nascido no Lugar de Pilar, Amares. O filme, sem ser nada de outro mundo, serve para recuperar boa parte do encanto que o artista teve e transmitiu, mas serviu também para que o protagonista da história fizesse um tour musical por Portugal, começando por uma emblemática boate no país onde o próprio cantor deu shows.

Da Espanha, esperamos que este filme, lançado em 2019, sirva para reeditar seus discos de vinil. Mais do que tudo porque os poucos que estão disponíveis não estão a preços muito acessíveis. Algo que com certeza tem muito a ver com a importância desse músico e o quanto sua música é valorizada.

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